terça-feira, 22 de agosto de 2017

GoT



Em primeiro lugar, chamo a atenção para a sábia e estimulante concisão do meu título, que é um piscar de olho aos milhares que elegem Game of Thrones a uma série de culto, revelando, ao mesmo tempo, o meu estatuto de cromo familiarizado com a gíria. O que, no caso, é falso, pelo menos a esse ponto: aprendi ontem, no Facebook e por acaso, o que significa GoT (Game of Thrones, precisamente).

Duas amigas minhas reagem com algum enfado a esta histeria colectiva a propósito de uma série. Uma delas, há algum tempo, escrevia: «Que refrescante ouvir todas as pessoas a falar acerca de A Guerra dos Tronos, Cercei ou Tyrion, e não fazer a menor ideia do que estão para ali a dizer.» Este «para ali a dizer» dói. Mas coitada. Sentir-se desintegrada é um pesadelo que, infelizmente, conheço demasiado bem. Vangloriar-se do facto, já me parece grave. Nada a acrescentar.

A outra amiga ironizava, numa mensagem: «Vou aderir ao 1% de portugueses que não segue A Guerra dos Tronos

No caso desta última amiga, o paradoxo é desconcertante, porque calha ela ter seguido, durante séculos, a série Lost - que, essa sim, me deixava completamente «lost», a interrogar-me sobre um obeso, de cabeleira e barba, a passear-se por uma ilha, um asiático que não entendia a língua dos outros, um homem de grande crueldade, apesar de a sua provecta idade aconselhar a que se não exaurisse em planos macabros e, o melhor de todo este idílico disparate, a obrigação de se ir marcando o ponto numa ridícula máquina, sim, numa ilha deserta, sem o que poderia acontecer - bem! nem eles sabiam o quê; provavelmente, nada de mais.

Parte do prazer de nos entusiasmarmos com A Guerra dos Tronos é, concedo, o sentimento de pertença a uma comunidade. Há ícones, frases (The winter is coming), nomes (Cercei ou Tyrion, justamente), suspenses, em síntese: as inúmeras referências fundadoras de um mundo do qual, de algum modo, fazemos parte. E essa comunicação torna-se eléctrica, viciante, ruidosa, exaltante.

Mas, sobretudo, para lá do fenómeno da comunicação que o orbita, tal mundo contém, desde o início, o magnetismo que nos atrai. Ou melhor: compreendo que possa não atrair todos, sobretudo pessoas com menos paciência para sagas fantásticas, com dragões (mas não muitos, na verdade: trata-se de uma espécie praticamente extinta), uma irmã que dorme com o irmão, um Exército de Mortos, um anão sábio e sarcástico ou heróis que são periodicamente ressuscitados. A esses torcedores profissionais de nariz, a esses espíritos tacanhos e burocráticos, recomendo que se mantenham agarrados às suas costumeiras sensaborias, como o C.S.I. Aí, pelo menos, livram-se de outras surpresas que não sejam ver o empregado de Cheers, um certo bar do meu tempo, metamorfoseado em detective.

Aos outros, caramba! digo que poderão mudar decisivamente as suas vidas. É nada menos, afinal, do que a recomendável série que une benfiquistas, portistas, sportinguistas e por aí fora, vegetarianos e gente que não viu a Luz, professores, alunos, mordomos, tiranos, súbditos, escravos, avarentos, perdulários, proeminentes, deprimentes, depressivos, varredores, corredores e bloggers. Une-os numa atracção fatal. Faz-me lembrar quando o país inteiro, incluindo a Assembleia da República (que é, em si mesma, um país, e em geral estranho ao país), estacionou para, onde houvesse um televisor, se acompanhar o fim de Gabriela, Cravo e Canela. Pois A Guerra dos Tronos possui, hoje, um similar poder. Personagens intrigantes, inesperadas, rivalidades mortais, alianças feitas e em breve desfeitas. Mais um bónus: a dor de alma que se crava, em todos os espectadores fiéis, perante a suprema facilidade com que se deixa morrer figuras essenciais, por quem porventura nos apaixonáramos, ou sem as quais julgámos que nada mais seria igual.  

1 comentário:

  1. Pronto...eu não consegui passar do episódio 3 da 1ª temporada...aiaiai vou ser excomungada!!! Meeeeedo!!!

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